Cinema

Crítica: Duna, de Denis Villeneuve, é um monumento à morosidade

Publicado em: 26/10/2021 15:42

 filme chegou na quinta-feira (21) aos cinemas do Recife (Reprodução)
filme chegou na quinta-feira (21) aos cinemas do Recife (Reprodução)
Em entrevista ao IndieWire, o diretor Denis Villeneuve explicou que o seu Duna não seria uma "adaptação obscura para fãs do livro", mas um longa “pop”. O filme, que chegou na quinta-feira (21) aos cinemas do Recife, não é nenhuma dessas definições. 

Pensado, segundo o próprio cineasta, para ser visto no IMAX como uma experiência imersiva, Duna é um projeto que carrega as piores características da sua carreira: a grandiloquência visual vazia, pseudo planos contemplativos e o pouco interesse por criar cenas realmente interessantes.

É uma tarefa difícil transformar o romance homônimo de Frank Herbert em algo enfadonho, principalmente para quem terá o primeiro contato com a obra através do filme. Para resumir, Duna se passa num futuro distante onde o universo é administrado por um imperador espacial e algumas “casas nobres” que auxiliam governando planetas e estrelas. 

A colonização espacial é feita a partir de uma espécie de organização feudal entre duques, barões e lordes. Não é preciso dizer que toda essa política gira em torno de pequenos jogos de poder e traição. No centro está Arrakis, ou Duna, um mundo desértico onde se encontra a especiaria que sustenta o universo, e é habitado por uma singular raça de humanos e vermes gigantes. 

É aí que chegamos em Paul Atreides, herdeiro da Casa Atreides, e peça chave em toda a trama. Acompanhamos a sua jornada rumo a um destino que parece ter sido traçado antes mesmo do seu nascimento.
 
Paul Atreides, herdeiro da Casa Atreides, é peça chave em toda a trama (Reprodução)
Paul Atreides, herdeiro da Casa Atreides, é peça chave em toda a trama (Reprodução)
 

De fato, Duna é uma obra tão singular que é impossível fugir da fidelidade ao andamento da trama literária. No entanto, a forma como esse material se transfigura em “cinema” diz mais sobre quem o está conduzindo, do que o próprio livro em si. 

Para testar essa teoria, basta colocar o projeto de Villeneuve ao lado da conturbada adaptação do cineasta David Lynch. Polêmicas à parte, Duna (1984) é um filme de caráter histriônico, uma ficção científica incomum que seduz o espectador pelo um emaranhado narrativo que nunca tenta se explicar. São tantos elementos, personagens aleatórios e visualmente inventados por Lynch (um deles é um bizarro cérebro gigante), que todo aquele universo é germinado nas próprias particularidades do filme. O resultado é uma abordagem, no mais simples adjetivo, cafona, mas uma cafonice prolífica, que dá vida própria a um mundo excêntrico por essência.

Em um lado oposto, Duna (2021) é um filme que se leva a sério demais, ou pelo menos acha que isso significa ter “profundidade”. As paisagens desérticas, os maquinários futurísticos e as roupas exóticas são coloridas por tonalidades frias, sem qualquer inventividade na concepção visual. Mais protocolar que isso são as cenas de ação ou os momentos ápices da trama, recheados de gimmicks dramáticos e soluções tão presentes em blockbusters recentes. 

A ambiguidade que permeia aquele universo complexo, metafórico, beligerante e movido por guerras violentas, é transformada em uma pasteurização para um público já acostumado a uma Hollywood estéril e pouco afeita as insinuações ao sexo ou qualquer coisa que não seja politicamente consumível. E ninguém melhor que Villeneuve, um dos seus principais representantes para sintetizar isso em um filme.
 
 

Para não dizer que tudo é ruim, o longa foge de uma aproximação didática ao universo da obra, evitando gastar tempo com explicações. O que não quer dizer que o filme seja curto. São duas horas e meia de idas e vindas sem um momento catártico – como justificativa, temos que nos contentar com o anúncio de uma possível segunda parte. 

Com um elenco múltiplo com nomes como Zendaya, Timothée Chalamet, Rebecca Ferguson, Oscar Isaac, Jason Momoa, Javier Bardem e Chang Chen, Duna é um monumento à morosidade que permeia os últimos blockbusters norte-americanos. Agora, também “acinzentando” os universos ricos dos clássicos fundadores da ficção científica. 
 
Por João Rêgo 

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